BahiaCrime / DenúnciaFake NewsImprensa

O maconheiro e as fake news

André Curvello

Era finalzinho do dia da data magna da Bahia quando tomei conhecimento de um treinamento que virou vídeo – e automaticamente um meme – mostrando a marcha de um grupo de policiais, possivelmente da Polícia Militar de Minas Gerais, que entoam um cântico que diz em um dos trechos “cabra safado, metido a maconheiro”. Não vou entrar no mérito deste tipo de manifestação tipicamente militar, pois o assunto aqui é outro: as fake news e a falta de cuidado da mídia.

Rapidamente, os criminosos e oportunistas das notícias falsas espalharam e divulgaram uma nova versão vídeo, no qual se ouve “cabra safado, petista maconheiro”. Já se tem uma ideia do tipo de gente de má fé que tomou esta iniciativa, porém o pior é que sites de alguma história e reputação no mercado abriram espaço em suas redes sociais a essa manipulação.

Isso mesmo! Sites de relevância divulgaram a notícia falsa sem o menor cuidado de verificar sua autenticidade. E onde ficaram as regras básicas do bom jornalismo? Será que perder alguns minutos apurando a notícia irá causar muitos prejuízos à insana busca por cliques? Ao jornalista não interessa os danos que podem ser provocados com a publicação precipitada de notícias sem checagem? As prováveis respostas a essas perguntas não são animadoras.

Em resumo, o compromisso com a boa informação deixou de ser prioridade da prática jornalística. Publicar a verdade virou apenas uma alternativa eventual. O norte de parte da imprensa passou a ser, lamentavelmente, aumentar a audiência e o faturamento resultante dela.

Jovens são jogados nas redações dos veículos on e off sem qualquer tipo de orientação e treinamento apropriados, sem salários dignos e condições aceitáveis de trabalho. São frutos da tecnologia e da pressa líquida da sociedade contemporânea.

É um assunto que faz parte do dia a dia, mas que vamos normalizando, deixando pra lá, porque também somos arrastados pela correnteza das relações robóticas e descompromissadas que continuamente construímos com o mundo que nos cerca.

Os donos dos veículos de comunicação muitas vezes não são jornalistas e não estão preocupados com a qualidade da informação, nem tampouco com a responsabilidade social que deveriam ter. É como se estivessem hipnotizados, em um fanatismo quase religioso, pelas divindades das visualizações, likes, comentários e compartilhamentos.

A informação tornou-se um mero subproduto, como um alimento ultraprocessado. Não nutre, no máximo enche a barriga. Pelo alcance que têm, pela importância que ganharam na vida das pessoas, pelo poder que adquiriram de transformar a realidade, a preocupação única e imutável dos veículos de comunicação deveria ser o bem estar da população e a construção de uma sociedade saudável.

E não se atinge tal objetivo com a publicação de notícias falsas. Esse debate precisa ser feito de maneira clara e profunda. Porém, a situação ganha ares de indisfarçável cinismo quando qualquer crítica ao exercício do jornalismo feito hoje em dia é classificada como censura ou atentado à liberdade de expressão. Liberdade e responsabilidade não apenas rimam: uma não existe sem a outra, é bom lembrar.

Vamos lá: a liberdade de expressão é inviolável, as garantias da imprensa livre são indiscutíveis. No entanto, a sociedade democrática só se fortalecerá com uma imprensa socialmente consequente que não meça esforços para tomar todas as medidas, de forma inegociável e permanente, para evitar a publicação de notícias falsas ou caluniosas.

O caso da “música do maconheiro” é mais um crime do nosso dia a dia que precisa ser extirpado de uma vez por todas. Tão debatido transversalmente pelo Supremo Tribunal Federal, a figura do maconheiro foi usada por verdadeiros criminosos das fake news que destroem e degradam o nosso país.

Foto: Divulgação

Related posts

Governo do Estado institui comitê de políticas públicas voltado para a juventude baiana

Fulvio Bahia

UFBA inaugura primeiro prédio do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências

Fulvio Bahia

Correio Braziliense oferece curso gratuito para jornalistas interessados ​​em pautas de saúde

Fulvio Bahia

Deixe um comentário

Este site utiliza cookies para melhorar sua experiência. Nós assumimos que você concorda com isso, mas você pode desistir caso deseje. Aceitar Leia Mais