O encontro, promovido pela Bancada do Partido dos Trabalhadores na Assembleia, foi comandado pela deputada Fátima Nunes.
“O marco temporal é inconstitucional, e disso nós temos certeza. Uma boa parte da sociedade precisa entender o que significa o marco temporal. Não afeta apenas os povos indígenas, afeta todos os povos tradicionais, do ribeirinho ao quilombola, porque o território indígena não é só onde os indígenas estão, é o Brasil inteiro”. A fala emocionada é da co-coordenadora geral do Movimento Unido dos Povos e Organização Indígena da Bahia (Mupoiba), Patrícia Krinsi Pancararé, e foi concedida através de entrevista à equipe de reportagem da Assessoria de Comunicação Social da Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA), na chegada ao Auditório Jornalista Jorge Calmon, onde, na tarde da última quinta-feira (15), foi realizado ato público em defesa e apoio aos povos originários contra o marco temporal (PL 490/2007) e o PL 2903/2023, cujo texto encontra-se em tramitação no Senado Federal, e transfere para o Congresso Nacional a competência de demarcação das terras indígenas.
O encontro, promovido pela Bancada do Partido dos Trabalhadores (PT), foi presidido pela deputada Fátima Nunes, líder da bancada do PT na ALBA, e contou com a presença de representantes dos 30 povos indígenas existentes na Bahia. Segundo a parlamentar, os povos originários têm direitos a serem reparados no Brasil, mas, atualmente, estão com a existência ameaçada. “É natural que a classe que resiste seja aquela que conquista, e esse é um ato de resistência a todas as situações de conflitos, mas principalmente a este PL 490, que representa um meio de diminuir a possibilidade do nosso povo indígena viver onde eles estão, e no lugar que eles desejam. Não há Bahia sem os povos indígenas, não há Brasil sem os povos indígenas”, afirmou.
Conforme ressaltou o coordenador geral do Mupoiba, Agnaldo Pataxó Hãhãhãe, atualmente na Bahia existem 30 povos indígenas, com 60 mil espalhados no meio rural em 198 comunidades, e com 100 mil vivendo nas favelas das grandes cidades, perfazendo um total aproximado de 160 mil indígenas habitando o território baiano. Segundo Agnaldo, caso os projetos mencionados sejam aprovados, trarão prejuízos de tamanha magnitude que ainda não é possível mensurar. “Na Bahia, por exemplo, mais de 70% dos povos originários deixarão de existir. Então, a gente acredita que o marco temporal não existe para nós. Se for para fazer um marco temporal, esse marco temporal tem que reconhecer quem chegou aqui antes de 1500. Se o Congresso Nacional aprovar o PL nº 2903 e o STF reconhecer o marco temporal, a gente não vai reconhecer. Nós vamos ao tribunal internacional e vamos juntar a sociedade para poder fazer a resistência, porque na nossa compreensão é a de que é melhor resistir para existir do que desistir para não existir”, ressaltou.
Vereador licenciado, o cacique Flávio Kaimbé afirmou contar com o apoio da Assembleia Legislativa da Bahia para a movimentação e articulação com os parlamentares da oposição e também com os deputados e senadores baianos que possuem mandato em Brasília para votarem contra as proposições em tramitação no Congresso Nacional. Além disso, ele alertou para a necessidade de elegerem mais políticos indígenas, a fim de possuírem um número maior de defensores da causa originária com voz nos espaços de poder.
“Sabemos que a demarcação é atribuição do Governo Federal, porém precisamos de toda a força, e o Legislativo da Bahia é fundamental para poder fortalecer nós, como indígenas e cidadãos. Pensando no futuro, precisamos ainda eleger mais políticos indígenas. Só assim vamos ter condições de lutar pelos nossos direitos e reduzir o risco de desamparo em condições mais equiparadas”, afirmou.
Os deputados Hilton Coelho (Psol), Neusa Cadore (PT) e Cláudia Oliveira (PSD), que compuseram a mesa juntamente com as lideranças indígenas, declararam apoio aos povos originários na luta contra o marco temporal (PL 490/2007) e o PL 2903/2023.
“As comunidades indígenas estão mobilizadas contra essaproposição que, ao meu ver, é o maior retrocesso civilizatório para o povo brasileiro, que pode acontecer no atual momento com a possível aprovação do nefasto marco temporal. O marco temporal é uma proposta para deixar no limbo qualquer tipo de reconhecimento dos territórios indígenas que sejam anteriores à Constituição de 1988, e isso vai levar a um processo, que já está acontecendo, de conflito, e pode se agravar tremendamente. Isso é inaceitável. Esse marco temporal não pode, de jeito nenhum, ser aprovado, para o bem do Brasil”, afirmou Hilton Coelho.
Para o secretário Geral das Comissões, Bira Corôa, o marco temporal é a institucionalização da grilagem no Brasil. “O marco pode representar o extermínio dos povos indígenas e originários. Ele é um atentado à condição de sustentação ambiental do país, e um favorecimento à exploração irregular de minérios. Trata-se, sem dúvida, de uma criação do Congresso Nacional para atender os interesses dominantes e dos exploradores inconsequentes do nosso país”, criticou.
A deputada Neusa Cadore ressaltou a importância do evento na ALBA, e destacou a criação da Frente Parlamentar Ambientalista e em Defesa dos Povos de Originários e Tradicionais, que será instalada no dia 3 de agosto deste ano. “Trata-se de uma frente mista, constituída de deputados, deputadas e também de quem queira participar das representações da sociedade civil. São espaços onde essa conexão será tão necessária para a gente desempenhar o nosso papel de legislar, propor programas, e realizar a mediação institucional. Quero dizer que as portas desta casa estão abertas para continuarmos construindo com vocês”, afirmou.
De acordo com a deputada Cláudia Oliveira (PSD), a situação precisa ser enfrentada de maneira conjunta, com o reforço dos legisladores. “As mazelas que estão acontecendo com o povo originário são inaceitáveis. Quero dizer que o nosso mandato também está à disposição. Tenham o nosso gabinete como colaborador”, afirmou.
Além dos já mencionados, participaram do ato público a chefe de gabinete da Secretaria de Direitos Ambientais e Territoriais do Ministério dos Povos Indígenas, Juliana Tupinambá; Suely Kiriri – liderança indígena da Aldeia Mirandela; o cacique do povo Pataxó HãHãHãe, Nailton Muniz; e o cacique Juvenal Tupinambá, do município de Eunápolis.
Fonte: ASCOM ALBA
Foto: CarlosAmilton/AgênciaALBA