A luta pela saúde da mulher negra no Brasil exige uma abordagem urgente e específica, especialmente no que diz respeito ao câncer de mama. As estatísticas são alarmantes: mulheres negras têm 57% mais chances de morrer pela doença do que as brancas, e as pardas apresentam um risco 10% maior. O subtipo mais agressivo, o câncer de mama triplo negativo (TNBC), é mais frequente entre as mulheres negras, tanto no Brasil quanto no exterior, revelando um padrão global de vulnerabilidade.
Esses números destacam uma questão de justiça social e de equidade na saúde. Não é apenas o aspecto biológico que deve ser levado em consideração, mas também as condições de vida dessas mulheres. Fatores como o menor acesso a serviços de saúde, diagnóstico tardio e as dificuldades em completar tratamentos eficazes contribuem para esses desfechos mais graves. Em outras palavras, o câncer de mama em mulheres negras não é apenas uma questão médica, mas também social.
O estudo Mantus, desenvolvido pelo INCA, oferece uma oportunidade única para avançarmos nessa compreensão ao abordar o câncer de mama triplo negativo em mulheres negras sob múltiplas perspectivas: sociais, comportamentais, ambientais e biológicas. A pesquisa não apenas foca na cor da pele autodeclarada, mas também investiga a ancestralidade dessas mulheres, levando em conta as influências genéticas que podem aumentar os riscos de desenvolver essa forma mais agressiva da doença.
A importância desse estudo é ainda maior quando consideramos que 76% da população que utiliza o Sistema Único de Saúde (SUS) é composta por negros. Isso significa que os resultados dessa pesquisa têm o potencial de impactar diretamente a saúde da maioria dos brasileiros. Ao produzir dados científicos que possam subsidiar estratégias de prevenção, diagnóstico precoce e novos tratamentos, podemos reduzir os custos e melhorar a qualidade do atendimento no SUS, oferecendo mais equidade e justiça no sistema de saúde.
Como mulher negra e vereadora, sinto uma responsabilidade ainda maior em trazer visibilidade para esse tema. A campanha Outubro Rosa deste ano, com o tema “Mulher: seu corpo, sua vida”, destacou que não estamos apenas falando de câncer de mama, mas de toda a saúde da mulher. Isso nos força a encarar um cenário em que a mulher negra, frequentemente marginalizada, precisa de políticas públicas específicas que contemplem sua realidade e garantam que suas vidas e corpos recebam o cuidado que merecem.
É fundamental que a sociedade e os gestores priorizem o acesso igualitário aos serviços de saúde, com ênfase em campanhas de conscientização e no diagnóstico precoce. A inclusão de centros de pesquisa em regiões de maior população negra, como o Nordeste, é um passo importante, mas é preciso ir além: transformar esses estudos em políticas públicas que assegurem tratamento digno e eficaz para todas as mulheres.
A saúde da mulher negra é uma questão de sobrevivência, e ela deve ser tratada como prioridade. A luta contra o câncer de mama agressivo só será vencida quando todas as mulheres, independentemente de sua cor de pele, tiverem o mesmo acesso a cuidados de qualidade. Essa é uma batalha que não podemos nos dar ao luxo de perder.
*Ireuda Silva é vereadora de Salvador pelo Republicanos. É presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher e vice-presidente da Comissão de Reparação.
Fonte / Foto: Ascom ver Ireuda Silva