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Uso medicinal da cannabis: informação é a cura para mitos e desinformação

Nós conversamos com personalidades do setor que revelaram como fazer a cannabis se tornar um assunto sem tabus

A cannabis medicinal, embora amparada por regulamentações no Brasil, ainda enfrenta uma série de estigmas e preconceitos que dificultam seu reconhecimento como alternativa legítima de tratamento. Por isso, é preciso falar mais sobre o tema. Para entender como combater o preconceito e a desinformação, sem causar conflitos e constrangimentos, nós conversamos com pessoas que suas histórias de vida estão entrelaçadas ao uso terapêutica da planta.   

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Ana Júlia Kiss, fundadora e CEO da Humora. Crédito da imagem Luciano Alves


Começamos a “falar mais sobre” cannabis a partir da perspectiva da empresária Ana Júlia Kiss, CEO da Humora. Para ela é essencial ampliar o debate sobre o tema, educar o público sobre os benefícios comprovados da planta e combater a desinformação que ainda permeia a sociedade. 

Ana Júlia Kiss explica os desafios que enfrenta ao longo de sua trajetória no setor de cannabis medicinal: “Primeiro, eu acredito que os principais mitos e preconceitos que ainda cercam o uso da cannabis medicinal são bem evidentes. É curioso, porque, sendo uma viajante nômade, onde quer que eu vá no Brasil e fale sobre o uso de cannabis medicinal, a pergunta que mais ouço é: ‘Mas é legal?'”.

Essa dúvida, para a empresária, revela uma falta de compreensão mais ampla. “As pessoas não entendem que, sim, no Brasil, apesar de toda a burocracia, a cannabis medicinal está minimamente amparada pela legislação. Embora não haja uma lei específica sobre o tema, o uso é possível e real. Já existem 10 anos de regulamentação, com cerca de 600 mil pacientes e quase mil marcas no mercado. A maioria da população brasileira, no entanto, ainda não entende que é algo legal”, afirma Ana Júlia.

Segundo a empresária, existem dois grupos principais que já têm um conhecimento mais profundo sobre a cannabis medicinal: os pacientes crônicos, que após tentarem diversas alternativas encontraram na planta uma solução, e os entusiastas, que têm grande interesse pelo tema. “Os pacientes crônicos são resilientes, muitos são mães ou cuidadores, enfrentam questões extremas e nunca param de buscar soluções. Já os entusiastas são apaixonados pelo tema e estão sempre à frente na busca por mais informações”, destaca.

No entanto, Ana Júlia alerta que a grande maioria da população ainda não compreende o potencial da cannabis como tratamento legítimo. “A questão está na pauta de costumes. Falar abertamente sobre o uso de cannabis para tratar condições como ansiedade, foco, performance esportiva ou doenças crônicas é algo que ainda gera resistência nas discussões culturais no Brasil. Esse é, para mim, o maior mito e preconceito: a dificuldade de tratar a cannabis como uma alternativa legítima e acessível”, conclui. 

Desmistificando o Uso Medicinal da Cannabis

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Christiani Di Risio, Gerente de Operações da QuironCBD e Diretora de Projetos Assistenciais da Associação Inclusa | Foto: Arquivo pessoal

Christiani Di Risio, Gerente de Operações da QuironCBD e Diretora de Projetos Assistenciais da Associação Inclusa, acredita que é fundamental ampliar o debate sobre o tema e combater a desinformação. Ela compartilha sua visão sobre a evolução da regulamentação, os desafios enfrentados pelas famílias e a importância de uma formação mais adequada para os profissionais de saúde.

Segundo Christiani, os mitos que ainda permeiam o uso medicinal da cannabis são profundos e persistentes. “Um dos maiores estigmas é o de que a cannabis seria uma ‘porta de entrada’ para outras drogas. Muitas vezes, mães que defendem o uso medicinal enfrentam críticas duras, sendo acusadas de estarem ‘viciando’ ou ‘drogando’ seus filhos”, comenta. Ela acredita que a melhor forma de combater esses preconceitos é por meio da informação. “Desmistificar esses conceitos equivocados e levar essa discussão a um público mais amplo é essencial para promover uma compreensão mais humana e responsável sobre o uso medicinal da cannabis.”

A empresária observa que o acesso à informação é a chave para transformar percepções e quebrar barreiras culturais. “Quando as pessoas entendem os benefícios terapêuticos reais da cannabis, é possível combater o estigma e abrir espaço para tratamentos mais eficazes”, afirma.

Avanços Regulatórios e Desafios Persistentes

As resoluções da Anvisa, RDC 660 e RDC 327, marcaram um importante passo para regulamentar o uso medicinal da cannabis no Brasil, mas Christiani destaca que ainda há obstáculos a serem superados. “Quando solicitei a autorização para meus filhos em 2016, o processo levava cerca de três meses e qualquer divergência aumentava esse prazo. Hoje, é possível solicitar a autorização em 10 minutos através do portal Gov.br”, relata.

No entanto, apesar dessa evolução, existem dificuldades que continuam a impactar famílias. “A RDC 660 ainda apresenta obstáculos que dificultam o acesso. Já a RDC 327, que exige a receita azul, continua sendo um entrave, pois limita o acesso e torna o tratamento mais difícil para muitas pessoas”, aponta Christiani.

Benefícios Terapêuticos e Resultados Positivos

 

Christiani compartilha sua experiência pessoal com o uso medicinal da cannabis. “Sou mãe de dois filhos gêmeos autistas com deficiência intelectual, e o uso da cannabis foi uma ferramenta terapêutica transformadora. Hoje, nossas vidas são muito diferentes graças a essa alternativa de tratamento”, explica.

Ela destaca que, ao longo dos anos, tem acompanhado inúmeros relatos de pacientes, especialmente da terceira idade, que têm encontrado alívio para condições como insônia, ansiedade e dor crônica com o uso de cannabis medicinal. “A diversidade de produtos à base de cannabis tem facilitado o tratamento, mas é necessário que os médicos recomendem essas opções com mais frequência”, observa.

 

A Importância da Formação Médica


Christiani defende que a formação dos médicos e profissionais de saúde sobre o uso medicinal da cannabis ainda precisa ser aprimorada. “A educação é fundamental para que o uso da cannabis seja visto como uma opção viável e segura. Muitas vezes, a falta de conhecimento sobre o Sistema Endocanabinoide é o que impede médicos de prescreverem cannabis com mais confiança”, argumenta.

Ela ressalta que, nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), a compreensão sobre o uso de cannabis medicinal deve ser mais profunda. “Os médicos precisam entender a fundo o Sistema Endocanabinoide, para oferecer informações claras e precisas sobre o uso terapêutico da cannabis”, afirma Christiani.

 

Perspectivas Futuras e Inovações no Setor


O mercado de cannabis medicinal no Brasil está se expandindo, mas ainda há desafios pela frente. Christiani acredita que a inovação será fundamental para a evolução do setor. “As tendências de novos produtos à base de cannabis, como gummies e fitocanabinoides isolados, são promissoras. No entanto, ainda falta uma base científica mais robusta para que os médicos possam prescrever esses tratamentos com mais segurança”, observa.

Ela também destaca a importância de pesquisas contínuas, que ajudarão a esclarecer os benefícios e as melhores formas de consumo dos produtos à base de cannabis.

 

A Informação como Chave para o Acesso

Christiani defende que a disseminação de informações corretas é um passo essencial para aumentar o acesso de pacientes ao tratamento com cannabis. “A informação deve ser acessível tanto para médicos quanto para pacientes. Para os médicos, ela deve ser técnica e especializada, para que o uso da cannabis seja visto como uma opção segura e eficaz. Já para os pacientes, é necessário apresentar a informação de forma clara e simples, para que eles possam entender o potencial terapêutico e questionar seus médicos sobre a inclusão da cannabis no tratamento”, afirma.

 

Desafios e Barreiras no Mercado Brasileiro

Embora o potencial da cannabis medicinal seja vasto, a indústria ainda enfrenta desafios no Brasil. “A falta de uma regulamentação mais clara e eficiente ainda é um dos principais obstáculos. A Anvisa impõe regras rígidas, dificultando o crescimento do setor. Ao mesmo tempo, existem contradições, pois as Associações de Cultivo Coletivo conseguem fornecer óleo de cannabis sem as mesmas exigências de controle que a indústria formal”, explica Christiani.

Ela enfatiza que para que o mercado de cannabis no Brasil cresça de forma sustentável, é necessário um equilíbrio justo na regulamentação, que garanta tanto o desenvolvimento da indústria quanto a segurança dos pacientes.

 

Impacto da Legislação na Qualidade de Vida dos Pacientes

Christiani finaliza destacando que a falta de uma legislação mais abrangente impacta diretamente a qualidade de vida dos pacientes. “O alto custo dos produtos à base de cannabis ainda é um grande obstáculo para muitas famílias. Muitos pacientes reduzem a dose ou até interrompem o tratamento por questões financeiras. Garantir o acesso financeiro e regulamentar é essencial para que todos possam se beneficiar dos avanços terapêuticos da cannabis”, conclui.

 

Cannabis é uma droga perigosa?


 

Daiane Zappe
Daiane Zappe durante entrevista para o Sechat na Medical Cannabis Fair 2024 | Foto: Sechat 

2024 e o uso medicinal da cannabis ainda tem sido um tema envolto em preconceitos com raízes históricas e culturais. Daiane Zappe, gerente de negócios da Revivid Brasil, abriu seu ponto de vista sobre os principais desafios enfrentados pela indústria e a importância da educação e regulamentação para ampliar o acesso aos tratamentos derivados da planta.

“Minha geração cresceu ouvindo que a cannabis era uma droga perigosa, uma porta de entrada para o crime, e que destruía neurônios”, afirma Daiane. Segundo ela, essa percepção errônea foi alimentada por campanhas nos Estados Unidos e replicada no Brasil com um forte viés racista e de exclusão social.

Ela explica que, durante muito tempo, o medo gerado por essas campanhas levou a sociedade a associar a planta à criminalidade, o que criou um estigma que persiste até hoje. “A única maneira de combater esse preconceito é com informação baseada em ciência”, defende Daiane. Ela ressalta que as evidências científicas demonstram os inúmeros benefícios terapêuticos da cannabis, um fato que precisa ser cada vez mais divulgado.

 

Avanços na Regulamentação e Acesso ao Mercado

A RDC 660, regulamentação que permite a importação de produtos derivados da cannabis no Brasil, é considerada um avanço, mas Daiane aponta falhas que ainda precisam ser corrigidas. Embora o regulamento tenha aberto a possibilidade de os pacientes escolherem tratamentos com produtos importados, não há um controle sanitário rigoroso. A Anvisa, por exemplo, não realiza análises para garantir a qualidade dos produtos. Atualmente, mais de 600 marcas têm autorização para importar, mas nem todos os produtos possuem a composição anunciada. Daiane sugere que a Anvisa intensifique os controles de qualidade e segurança para assegurar o bem-estar dos pacientes.

Eficácia Terapêutica: Novos Horizontes para o Tratamento de Doenças

O uso de cannabis para tratar condições como epilepsia, dor crônica e ansiedade já está bem documentado, mas Daiane chama a atenção para estudos recentes sobre o uso da planta no tratamento de transtorno do espectro autista (TEA). A Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) está conduzindo um estudo inédito com adultos autistas, e os resultados iniciais são promissores.

Além disso, diversos relatos clínicos apontam os benefícios dos tratamentos com cannabis em pacientes com TEA, oferecendo uma nova esperança para essa população.

Formação Médica: A Necessidade de Atualização

A falta de formação sobre cannabis nas faculdades de medicina é um dos grandes obstáculos para o avanço no tratamento com a planta, segundo Daiane. A cannabis foi amplamente ignorada no meio acadêmico por muitos anos, e as poucas pesquisas existentes não foram realizadas em um ambiente regulado. “Nenhum profissional da saúde que está atuando hoje estudou cannabis na graduação ou pós-graduação”, observa. No entanto, ela destaca que alguns médicos têm buscado atualização no exterior e estão se tornando pioneiros na prescrição de cannabis, apesar da resistência de alguns órgãos, como o Conselho Federal de Medicina (CFM).

Perspectivas Futuras e Inovações

Daiane vê um grande potencial na cannabis além do CBD e THC, com pesquisas apontando que outros fitocanabinoides, como CBG, CBN e THCV, também possuem propriedades terapêuticas promissoras. Além disso, ela acredita que os terpenos da planta podem ser explorados em cosméticos e produtos de bem-estar. “A cannabis é uma caixa de ferramentas com muitas opções terapêuticas”, afirma.

Desafios no Mercado Brasileiro

O mercado de cannabis no Brasil ainda enfrenta barreiras significativas, tanto regulatórias quanto sociais. Daiane defende que as leis precisam acompanhar o avanço da ciência, especialmente no que diz respeito à qualidade de vida dos pacientes. “A sociedade já está compreendendo melhor o tema. Quando os resultados impactam a qualidade de vida, o preconceito perde força”, afirma.

Ela ressalta que, embora a legislação avance lentamente, a pressão da sociedade, especialmente de mães que lutam pelo tratamento de seus filhos, tem sido fundamental para a mudança. “A velha pergunta ‘e se fosse seu filho?’ ainda ressoa, e muitas mães estão levantando uma bandeira pela qualidade de vida de inúmeras pessoas.”

Desmistificação e Benefícios Terapêuticos

 

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Antonio Osvaldo, CEO da Visanco Consultoria

Antonio Osvaldo, CEO da Visanco Consultoria, buscou na história os argumentos para explicar que a cannabis é utilizada para fins medicinais desde os anos 2.700 a.C., conforme relatado na mais antiga farmacopeia chinesa. Segundo Osvaldo, “existe o mito da dependência da cannabis que está relacionado exclusivamente à dependência gerada pela presença do ativo THC em sua composição”. No entanto, ele explica que, com o avanço da tecnologia, o uso de canabidiol (CBD) isolado permite tratamentos sem risco de dependência. O CBD, ao contrário do THC, não causa esse efeito.

“Existem também alguns estudos com evidências científicas que demonstram a necessidade da presença do THC na composição desses produtos, em função da indicação terapêutica de certas doenças”, completa Osvaldo. Ele cita como exemplo o medicamento Mevatyl, registrado pela Anvisa, que contém doses elevadas de THC (27 mg/mL) e CBD (25 mg/mL), sendo indicado para o tratamento da espasticidade moderada e grave relacionada à esclerose múltipla.

Regulamentação e Acesso no Brasil

As regulamentações mais recentes, como a RDC 660 e a RDC 327, abriram portas para a produção e comercialização de produtos à base de cannabis. No entanto, Osvaldo esclarece que a RDC 17/15, revogada, inicialmente permitia apenas a importação de produtos sem a devida aprovação da Anvisa. Ele afirma que essa regulação “contemplava somente a autorização para importação desses produtos por pessoa física, não sendo permitida a sua comercialização por farmácias e drogarias.”

O CEO também destaca a importância da RDC 327, que trouxe maior segurança ao setor. “Essa RDC possibilitou a fabricação, importação e comercialização de produtos à base de cannabis através de autorização sanitária concedida pela Anvisa, que exigiu a apresentação desses estudos.”

Porém, a questão do cultivo local ainda é um grande obstáculo. “Ainda não está autorizado o plantio da Cannabis para esse fim, pois depende de uma legislação específica e regulamentação própria”, afirma Osvaldo. Ele observa que, apesar disso, já existem projetos de lei em discussão e autorizações judiciais permitindo o cultivo para uso terapêutico.

Eficácia Terapêutica e Pesquisa

Apesar de o único produto registrado pela Anvisa atualmente ser o Mevatyl, várias pesquisas estão em andamento para testar os efeitos terapêuticos da cannabis. Osvaldo comenta que há um número crescente de estudos sendo conduzidos por empresas e instituições, que visam comprovar a eficácia da cannabis em condições como epilepsia, dor crônica e ansiedade. “No presente momento, o único produto que foi registrado pela Anvisa, a partir da avaliação dos estudos de eficácia e segurança, foi o Mevatyl”, explica.

Tendências Globais e Desafios do Mercado

O mercado global de cannabis medicinal está em expansão, e no Brasil, cerca de 50 produtos já têm autorização para comercialização. No entanto, Osvaldo observa que um dos principais desafios é a falta de regulamentação sobre o cultivo. “Talvez esse seja o principal desafio, assim como se torna necessário uma autonomia quanto ao desenvolvimento dos IFAs a partir do fornecimento local da matéria-prima produzida no próprio país.”

O Impacto da Legislação no Acesso ao Tratamento

A legislação tem um impacto direto na qualidade de vida dos pacientes que dependem de tratamentos à base de cannabis. Osvaldo ressalta a importância da regulamentação para aumentar a confiança nos produtos. “A legislação é muito importante para o paciente na medida em que ela possibilita uma confiabilidade maior quanto à eficácia, segurança e qualidade dos produtos à base de Cannabis.” Ele também observa que a incorporação desses produtos no SUS é um passo importante para facilitar o acesso à população de menor renda.

O Papel da Informação no Acesso ao Tratamento

A disseminação de informações corretas e respaldadas por órgãos como a Anvisa e o Ministério da Saúde é essencial para garantir o acesso ao tratamento. Osvaldo enfatiza que a qualificação médica é fundamental para que os pacientes possam contar com informações seguras sobre o uso medicinal da cannabis. “A qualificação médica é fundamental, assim como a difusão de informações seguras e respaldadas pela Anvisa, Ministério da Saúde e Secretarias de Saúde são indispensáveis.”

A Regulação da Cannabis no Brasil: Uma Jornada de Avanços


 

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Marcela Sanches, advogada criminalista e sócia no escritório Figueiredo Nemer e Sanches Advocacia Insurgente | Foto: Arquivo Pessoal

A advogada Marcela Sanches é uma das vozes ativas na luta por mais liberdade e regulamentação no uso medicinal da cannabis no Brasil. Ela compartilha sua visão sobre os avanços e desafios no cenário atual, especialmente no que diz respeito à regulamentação e ao acesso a tratamentos terapêuticos.

Apesar das convenções internacionais de controle de substâncias reconhecerem que o uso de substâncias entorpecentes e psicotrópicas é indispensável para o alívio da dor e do sofrimento, a legislação brasileira ainda está em um processo de evolução. Marcela destaca que, por muitos anos, a cannabis foi completamente proibida no país. “Na prática, há 10 anos a Cannabis ainda era absolutamente proibida no Brasil. A partir de 2015, essa proibição foi flexibilizada pelas normas regulamentares sobre Cannabis e seus derivados da ANVISA.”

Ela explica que o marco regulatório começou a mudar em 2015, quando a ANVISA criou a primeira via regulada de acesso à cannabis para uso medicinal, por meio da importação de produtos derivados da planta. “Em 2015, a ANVISA criou a primeira via regulada de acesso, por meio da importação de produtos derivados de Cannabis, por pessoa física e para uso próprio.” A partir de 2017, a cannabis foi reconhecida como planta medicinal e inclusa na lista de denominações comuns brasileiras pela RDC 156, abrindo caminho para o uso terapêutico. Já em 2019, com a RDC 327, passou a ser possível fabricar e comercializar produtos de cannabis nas farmácias nacionais.

No entanto, Marcela ressalta que, apesar dos avanços, ainda há muito a ser feito. “O avanço foi muito significativo, mas temos um longo caminho pela frente. Ainda falta regulamentar o cultivo doméstico e associativo, as sementes, os produtos veterinários, os alimentos, o uso industrial, os cosméticos, dentre outros. Então precisamos continuar demandando.”

Uso Terapêutico: O Impacto dos Habeas Corpus

A questão do acesso ao uso terapêutico da cannabis também é uma preocupação central de Marcela. Atualmente, há mais de 6 mil salvos-condutos, conhecidos como habeas corpus (HC), que garantem o cultivo da planta para fins terapêuticos. Esses HCs têm permitido que pessoas de diversos estados do Brasil, incluindo crianças, adolescentes e adultos, possam acessar o tratamento com cannabis para diferentes doenças. 

Esses pacientes estão concentrados, principalmente, em São Paulo e no Rio de Janeiro, e o número de casos continua a crescer. Marcela sublinha a importância dessas decisões jurídicas para o acesso ao tratamento e a urgência de uma regulamentação mais abrangente e clara para permitir o cultivo doméstico e o uso associativo. “Dentre os pacientes estão crianças, adolescentes e adultos de 23 estados, concentrados, majoritariamente, em São Paulo e no Rio de Janeiro.”

Fonte: Sechat
Foto: Divulgação / Sechat

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